segunda-feira, 23 de abril de 2018

A Jornada do anti-herói: a sátira reparadora



Capa do clássico folheto Proezas de João Grilo,
de João Ferreira de Lima (Tupunanquim)

O nosso grupo de estudos na Casa Tombada – Viagem de Retorno ao País da infância – caminha para o terceiro encontro. Nas duas primeiras jornadas, abordamos facetas de contos maravilhosos como “Belisfronte”, “O Mestre-Sala”, “O Reino da Água Azul”, “José e Maria” e “Guime e Guimar”, todos de minha recolha (à exceção do terceiro, da faina de Djanira Feitosa). No nosso terceiro encontro, A Jornada do Anti-Herói: a sátira reparadora, porém, cederemos espaço à subversão. Melhor dizendo, trataremos de um personagem compósito, presente na tradição oral de todos os povos da Terra: o anti-herói. Ou seja, o herói às avessas. É o Corvo, dos contos esquimós, Exu, nos mitos iorubas, Hermes, em trajes de deus trapaceiro, na Grécia Antiga, e, de certo modo, Ulisses e Sísifo.

Nos contos jocosos e contos do ogro estúpido, ele aparece sob vários nomes, o maior comum deles, Pedro Malazarte (ou Malasartes). Também pode ser chamado de João Grilo, Bertoldo, e também de Camões (Camonge) ou Bocage (Bocais). Como os dois grandes poetas portugueses se tornaram personagens de facécias, algumas de caráter fescenino, não se sabe bem, mas certo é que, personagens incomuns, ainda em vida, reúnem em torno de si um vasto anedotário e, à medida que o tempo passa, acontecimentos reais ou inventados são incorporados à sua “biografia”, num processo natural de convergência. Till Eulenspiegel na Alemanha, Jean Machepied na França, Pedro de Urdemales na Espanha, Maestro Grillo na Itália, Nasrudim na Turquia, o personagem que vinga, por meio da astúcia, as injúrias e injustiças contra os desfavorecidos, tem mil e um nomes e número equivalente de truques. O contraponto feminino do trickster é a Maria Sabida, Maria Sutil [The Clever Peasant Girl, ATU 875], mais cerebral e menos cruel, respondendo com sagacidade ao despotismo real (que é, também, o despotismo masculino). É, portanto, uma legítima irmã de Sherazade.
Nasrudin (miniatura do séc. XVII)

Por se tratarem, muitos deles, de personagens também da literatura de cordel, pela primeira vez em nosso grupo recorreremos aos folhetos de feira e falaremos, ainda que de raspão, do Auto da Compadecida, a premiada peça de Ariano Suassuna, cujos alicerces estão fincados na poesia popular. Por isso, mostraremos trechos dos cordéis O Cavalo que Defecava Dinheiro, O Dinheiro e O Castigo da Soberba, os dois primeiros de Leandro Gomes de Barros, e o último atribuído a Silvino Pirauá de Lima.

Boa jornada!


P. S.: O próximo encontro ocorrerá dia 18 de maio, das 10h às 13h, na Casa Tombada (Rua Ministro Godoy, 109, Perdizes). 

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